terça-feira, 19 de agosto de 2014

O Fotógrafo - conto de Adriano Siqueira





O Fotógrafo
Por Adriano Siqueira

Eu sou fotógrafo. Tenho 32 anos e gosto de tirar fotos dos cemitérios. Meus trabalhos são bem conhecidos, mas mesmo sendo o único a fazer este tipo de trabalho no Brasil, eu estava desempregado.
Mantenho sempre em ordem meus e-mails para receber propostas nesta área.
Recebi uma mensagem para entrar em um grupo. (Grupo é onde algumas pessoas que tem gostos parecidos se encontram para comentar algo em comum. Depois de cadastrado enviamos uma mensagem para o e-mail do grupo e todos que estiverem cadastrados lá recebem esta mensagem).
Eu me cadastrei porque fui convidado para mostrar o meu trabalho para eles. Era um grupo de Magnatas que procuravam pessoas com trabalhos diversificados. Embora o nome do grupo não tivesse nada relacionado a isso.
Na parte de entrada do grupo mostrava a quantidade de pessoas que estavam lá, 283 estavam cadastrados.
Conheci o casal Martiniano, acho que eram moderadores do grupo, pois eles eram os que mais organizavam os comentários e enviavam muitas mensagens. Os nomes deles Eram Sarah Martiniano da Silva e Rogério Martiniano da Silva.
Logo que coloquei a primeira mensagem no grupo o pessoal começou a enviar muitas mensagens de boas vindas e diziam como estavam contentes em ter mais um integrante no grupo. Queriam me conhecer completamente. Perguntavam sobre o meu trabalho, as minhas fotos, quanto tempo eu tinha essa profissão etc.
Aos poucos fui conhecendo o pessoal. Eram as pessoas mais variadas em profissões e idades bem diferentes das outras. Engenheiros, advogados e estudantes. Os assuntos eram dos mais diversos. Mas todos tinham algo em comum. Eles não saiam muito! Ficavam no computador por horas.
Sarah era muito legal e falava com todos com seu jeito bem simpático. Ela me disse que queria ver amostras do meu trabalho, pois estava escrevendo um livro e acharia interessante as fotos dos cemitérios que tirei, e me pediu uma amostra.
Eu tinha um portfólio invejável, mais de mil imagens sobre tudo relativo a cemitérios no Brasil. Então coloquei uma amostra de 30 imagens nos arquivos do grupo. Assim todos poderiam dar uma boa olhada no meu trabalho. Realmente adoraram. Falaram que as fotos estavam muito nítidas e com muitos detalhes que só um fotógrafo profissional poderia dar.
Fiquei muito contente com o elogio. A Sarah ficou muito agradecida e já estávamos fazendo negócio para enviar muitas imagens com um preço bem agradável de 45 mil reais. Fiquei besta com o acordo. Mas ela queria ver todas as fotos. Isso iria me dar um trabalho e tanto. Mas aceitei.
Enquanto eu escaneava as fotos e colocava no grupo o pessoal ficava cada vez mais amigo meu; as meninas do grupo me tinham como um deus. Respondiam todas as mensagens que eu colocava lá e queriam saber tudo sobre mim. Realmente era o melhor grupo que eu conhecia. Elas não tinham ciúmes das outras e ficavam dizendo que eu poderia ficar com todas e podia enviar mensagens poéticas para elas sem problemas porque elas não eram ciumentas e até mesmo a Sarah dizia que o marido dela deixaria que eu saísse com ela tranqüilamente. Todas tinham paixão pelo gótico, pois comentavam sobre as fotos que eu tirava de cemitérios e adoravam ver todo o meu trabalho. Pediam mais; eram viciados por fotos assim e isso me deixava mais empolgado.
Mas um dia notei algo estranho. No começo achava comum alguns saírem, mas em uma semana o grupo perdeu mais de 100 associados e então perguntei que estava havendo. Foi quando fiquei encanado. Todos desconversavam. Até mesmo algumas meninas tinham saído do grupo e eu podia jurar que eu as tinha em minhas mãos. Uma pena. Mas eu percebi que o marido de Sarah não estava mais no grupo. Ela disse que teve que viajar urgente, mas que o contrato sobre o livro estava aberto e que eu deveria continuar a enviar as fotos para o grupo.
Como eu escaneava as fotos em resolução baixa (75 dpi é a resolução apenas para internet e não dá para publicar em revistas e jornais por ser muito pequena.) continuei colocando no grupo. E em uma noite eu havia colocado todas as fotos que eu tinha nos arquivos do grupo.
Enviei uma mensagem para o grupo dizendo que todas as fotos de cemitério que tirei estavam lá. Fiquei esperando as mensagens de elogios sobre o meu trabalho, mas não era bem isso que estava acontecendo.
Fui então para a página inicial do grupo onde continha o número de participantes. Quando me deparei com a surpresa.
Estava diminuindo a quantidade de pessoas do grupo rapidamente.
Fiquei em pânico. Enviava um monte de mensagens para o grupo perguntando o que estava acontecendo. Por que estavam abandonando o grupo.
Não tive nenhuma resposta. De cem pessoas diminuiu para 30 e foi diminuindo pela madrugada adentro até que ficou apenas um.
Era uma menina de 14 anos. Nunca falava no grupo. Seu nome era Michelle. Perguntei porque ela não havia saído também e se ela sabia de algo.
Ela foi muito clara e direta.
- As fotos do cemitério. As lápides! Veja os nomes das lápides! Veja os nomes dos túmulos.
Eram eles! Todos mortos, Sarah e Rogério, em cemitérios diferentes. A foto do túmulo do Rogério eu coloquei primeiro, por isso ele foi primeiro que ela, e estavam aqui para ver seu próprio túmulo. Eu mostrei para cada um deles sua própria lápide, seu próprio túmulo mostrando que estavam realmente mortos.
Meu Deus! Eu não podia acreditar. Devia estar ficando louco. Tinha que ver isso.
Fiquei com um arrepio macabro e com muito medo de tudo isso.
Verifiquei cada foto, cada imagem. Algumas realmente tinham nomes de pessoas que estavam no grupo.
Todos estavam lá. Fiquei conversando horas com Michelle e não sabíamos como eles tinham entrado neste grupo e nem sobre como morreram, pois as fotos foram tiradas em vários cemitérios.
- Michelle que aventura louca. Sabe se eu contasse aqui para o pessoal não acreditariam. Bom vou sair do grupo para nunca mais voltar. Obrigado por me ajudar a solucionar tudo isso.
Ela enviou uma única mensagem.
- Vai me deixar aqui sozinha? Não vai achar meu túmulo? Por favor, me ajude!!!
Novamente o arrepio passa por todo o meu corpo quase ficando sem forças para falar e com o coração saltando pela boca.
O que eu faço?
Não havia muitas respostas lógicas e nem sei se o que eu estava fazendo tinha explicação.
Peguei minha câmera e comecei a vasculhar os cemitérios da cidade. Eu tinha o nome inteiro dela. Nomes dos pais, tudo.
Finalmente eu achei seu túmulo. Tirei várias fotos, escaneei e coloquei no grupo quando finalmente o grupo ficou só com uma pessoa. Eu!
Decidi que nunca mais entraria em algum grupo na internet. Eu devia ter desconfiado de tudo isso já que o nome do grupo era bem sugestivo: “Almas Penadas”.
Mas algo deu errado.
Eu não conseguia sair do grupo.
Fui promovido a moderador do grupo? Não conseguia sair.
O que estava acontecendo? Eu era uma alma penada também?
Foi quando eu vi o número de participantes. Estava aparecendo novos cadastrados e aumentando de 10 para 50 para 70 e continuava crescendo.
Foi quando recebi a primeira mensagem.
- Me ajudem! Cadê meu túmulo?




Por Adriano Siqueira
siqueira.adriano@gmail.com



5 comentários:

Juliana Agata disse...

Nossa que legal, deu até uma nostalgia agora lendo esse conto!^^

Unknown disse...

Uau!!! Adorei o conto!! Parabéns, Adriano... !!!

Adriano Siqueira disse...

obrigado vocês pela leitura e considerem-se sempre bem-vindas :-)

Anônimo disse...

Parabéns pelo conto... muito boa leitura...

Unknown disse...

Eu amei esse conto! Realmente é muito...não tenho palavras mas eu amei sério você tem talento 👏👏👏👏👏